Da Folha de S. Paulo
Proposta é rever legislação do DF, que só permite a abertura de processo contra governador se Câmara Legislativa autorizar
Três ministros disseram à Folha que mudança dará ao tribunal a chance de adotar uma "postura exemplar" contra a impunidade no país
Os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) já começaram a discutir a melhor forma de dar uma resposta ao mensalão do DEM, escândalo que envolveu o governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, e seus assessores.
Essa resposta é a possibilidade de derrubar um artigo da Lei Orgânica do Distrito Federal que hoje condiciona a abertura de processo penal contra o governador à autorização prévia da Câmara Legislativa.
A Folha conversou, nas últimas semanas, com ministros da corte sob a condição de anonimato. Arruda e seus assessores são investigados por participarem de um suposto esquema de enriquecimento ilícito e pagamento de propina a deputados em troca de apoio na Câmara do DF. Ele nega.
O Supremo irá analisar, ainda neste semestre, uma ação direta de inconstitucionalidade proposta pela Procuradoria-Geral da República contra a Lei Orgânica do DF. Essa lei repete uma regra que ocorre em todos os Estados brasileiros.
Os governadores possuem foro no STJ (Superior Tribunal de Justiça). Quando o Ministério Público apresenta uma denúncia contra eles, porém, o tribunal só pode dar prosseguimento ao processo com a autorização de, no mínimo, dois terços dos integrantes das Assembleias Legislativas.
O problema é que, via de regra, os legislativos estaduais são dominados pelos governadores, como no caso de Arruda, o que inviabiliza o prosseguimento das investigações.
Por conta disso, o STJ em toda sua história conseguiu abrir ação penal apenas contra um governador, sendo que já chegaram mais de 50 pedidos contra eles, segundo informações do próprio tribunal. Se o STF mantiver a condicionante, estará, na prática, inviabilizando o prosseguimento das investigações contra Arruda.
Dois integrantes do STF disseram à Folha que a corte se depara com o problema da jurisprudência. O tribunal já entendeu, em diversas ocasiões, ser constitucional a "exigência pela Constituição Estadual da autorização prévia da Assembleia Legislativa" para processar o governador.
O argumento é que o presidente também só pode ser processado após autorização do Congresso e, portanto, deve-se respeitar o princípio federativo -o que vale para uma esfera de poder, deve valer para outra.
O ministro Marco Aurélio Mello já defendeu abertamente, em artigo publicado na Folha, a mudança dessa jurisprudência, ao citar a independência dos Poderes.
Outra composição
Outros colegas também rebatem a manutenção da postura, com o argumento de que os julgamentos sobre o caso ocorreram em um período em que a composição do STF era outra. Poucos ministros que estão na corte participaram dos debates e, portanto, podem pensar de forma diferente.
A reportagem ouviu de pelo menos três ministros que o tribunal terá a chance de adotar uma "postura exemplar" contra a impunidade no país e dar uma resposta à sociedade.
Um dos argumentos que está em discussão foi adiantado pelo Painel da Folha. Seria dizer que, diferentemente dos demais Estados brasileiros, onde tal regra é definida pelas Constituições estaduais, no DF ela consta da Lei Orgânica local.
A Folha apurou que o Ministério Público, caso ganhe essa primeira etapa no STF, já pensa em pedir que o governador seja afastado do cargo para não atrapalhar as investigações. Para isso, no entanto, ele precisa ser transformado em réu.
O relator do caso, ministro José Antonio Dias Toffoli, decidiu julgar diretamente o mérito do caso, o que é visto como um sinal de que estaria disposto a mudar a jurisprudência.
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