FOLHADE SÃO PAULO
ONG considera insuficiente objetivo do Brasil de reduzir desmate em 80%; sempre "alguém vai cortar alguma coisa", diz presidente
Ativistas do Greenpeace receberam Lula na cúpula Brasil/União Europeia para pedir que o país acabe com as derrubadas até 2015
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A ESTOCOLMO
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva descartou ontem o pedido do grupo ambientalista Greenpeace para que o governo brasileiro adote a meta de desmatamento zero até 2015.
"Mesmo que o Brasil fosse careca [não tivesse nenhuma cobertura vegetal], sempre vai haver alguém que vai cortar alguma coisa", disse o presidente, ao término da cúpula Brasil/União Europeia, realizada no Rosenbad, sede do governo sueco, que preside neste semestre a União Europeia.
À porta do Rosenbad, quando Lula chegou, um pequeno grupo do Greenpeace pedia que o presidente fosse a Copenhague, para a cúpula do clima, que vai ser realizada em dezembro, engatando o apelo no fato de o Brasil ter obtido a Olimpíada de 2016 exatamente na capital dinamarquesa: "Lula, você levou a Olimpíada. Agora salve o clima", dizia, em português, o cartaz dos militantes.
Lula já havia anunciado na véspera a sua intenção de participar da cúpula do clima, mas não tomou conhecimento do comunicado em que o Greenpeace considera "insuficiente" a meta do governo brasileiro de cortar o desmatamento em 80% até 2020. Para ele, trata-se de um objetivo "revolucionário", cujo cumprimento vai exigir "esforço incomensurável da sociedade brasileira".
O desmatamento zero até 2015 não é meta apenas de um grupo militante. Na véspera, principais produtores de carne do mundo,JBS-Friboi, Marfrig e Bertin comprometeram-se publicamente a não mais comprar carne de gado criado em áreas desmatadas a partir de 22 de junho passado.
A notícia foi parar no "Financial Times", numa indicação de quanto o desmatamento é, no Brasil, o vilão ambiental. "Responde por 20% das emissões globais de gases do efeito estufa", calcula o Greenpeace.
A presença dos ambientalistas acabou sendo um aviso antecipado de que a cúpula seria dominada pelo tema da mudança climática ou, mais especificamente, da reunião de Copenhague.
Apesar de faltar tão pouco tempo, o primeiro-ministro sueco, Friedrik Reinfeldt, foi franco o suficiente, na entrevista coletiva, para admitir que não houve, ainda, os progressos necessários para fechar um acordo que "salve o clima" como pedia o cartaz do Greenpeace e pedem todos os principais especialistas do planeta.
Mas tanto ele como o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, rotularam de "ambiciosa" a meta brasileira de cortar em 80% o desmatamento.
Protecionismo
Lula acompanhou a inquietação do anfitrião com o andamento das negociações a ponto de insistir que os chefes de governo deveriam ir em massa a Copenhague para tentar destravá-las no mais alto nível político. Os dois lados acertaram que, no percurso até a cúpula, haverá uma nova reunião entre brasileiros e europeus para tentar afinar as posições.
Reinfeldt deixou no ar a hipótese de que, à falta de um acordo em Copenhague, comece o que seria um novo tipo de protecionismo, o protecionismo ambiental.
O premiê sueco lembrou que quatro países europeus, incluído o seu, já adotam um imposto sobre o consumo de carbono. Funciona como estímulo para que as empresas e consumidores procurem produtos que consumam menos carbono, não taxados.
Mas são impostos nacionais. Agora, a França propõe que haja um tarifa de importação a ser cobrada de produtos provenientes de países que não tenham assumido compromissos de redução de emissão de gases.
Reinfeldt informa que ainda não houve um debate na União Europeia sobre a proposta francesa, mas deixou claro que, dependendo do que ocorrer em Copenhague, iniciativas como essa poderão proliferar.
A incerteza sobre Copenhague fez com que a cúpula produzisse um documento genérico, que recolhe as posições dos dois lados.
Diz por exemplo que o acordo sobre mudança climática deve ter metas claras e ambiciosas a médio prazo e compromissos juridicamente vinculantes para os países desenvolvidos, como demandam europeus e brasileiros. Aceita, para os países em desenvolvimento, um prazo mais longo para tais metas e deixa claro que "o desenvolvimento econômico e social, bem como a erradicação da pobreza, são as prioridades primordiais e absolutas".
Uma maneira elíptica de dizer que, para o Brasil e outros emergentes, é mais importante crescer que limpar o planeta.
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