Da Folha de São Paulo
Fazenda manda Receita adiar parte das restituições de IR para 2010 após alerta do Tesouro por causa da queda na arrecadação
Dos cerca de R$ 15 bilhões previstos para serem restituídos até dezembro, R$ 3 bilhões só deverão ser liberados no ano que vem
LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O governo federal começou a atrasar o pagamento das restituições do Imposto de Renda das pessoas físicas, em sua grande maioria trabalhadores da classe média, para compensar parte da queda de arrecadação de tributos neste ano. A ordem foi dada à Receita Federal pelo Ministério da Fazenda.
De aproximadamente R$ 15 bilhões que seriam inicialmente devolvidos até dezembro, cerca de R$ 3 bilhões só deverão ser liberados no primeiro trimestre do ano que vem.
Segundo a Folha apurou, a decisão foi informada à cúpula do fisco, no final de maio, pelo secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Machado, depois de um pedido do secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin.
A Folha conversou por telefone com Augustin na manhã de ontem, mas, ao ser informado do assunto, ele pediu para que a assessoria da Fazenda fosse acionada. Apesar dos reiterados pedidos de esclarecimento feitos pela reportagem, o ministério não ligou de volta até o fechamento desta edição.
O artifício de retardar as devoluções do IR foi posto em prática rapidamente. De junho a outubro houve um recuo de 21,7% nas restituições em comparação com igual período do ano passado -de R$ 7 bilhões para R$ 5,48 bilhões. As maiores reduções foram em agosto e setembro, quando os valores devolvidos aos contribuintes foram diminuídos a menos da metade dos números de 2008.
Ontem foi liberado mais um lote de restituição, com redução de 20% em relação ao mesmo mês do ano passado.
A devolução do IR se dá quando o contribuinte paga mais imposto do que devia, gerando um saldo a ser recebido do governo. As restituições são feitas de junho a dezembro, com as devoluções referentes às declarações retidas em malha fina podendo ser estendidas para os anos subsequentes.
Esta é a segunda medida adotada pela Receita neste ano relacionada à restituição do IR. Conforme a Folha publicou anteontem, também para elevar a arrecadação, o fisco apertou o cerco contra fraudes praticadas pela classe média.
Contas não fecham
Depois de quatro meses seguidos de queda na arrecadação de impostos, provocada principalmente pela crise global, o Tesouro percebeu que as contas do governo não fechariam neste ano se nada fosse feito.
Em maio, o presidente Lula assinou um decreto de revisão de arrecadação (excluindo-se receitas previdenciárias) com R$ 49 bilhões a menos do que a estimativa enviada ao Congresso no ano passado -de R$ 522 bilhões para R$ 473 bilhões.
Em junho, diante dos valores efetivamente cobrados pelo fisco até então, a projeção da arrecadação feita pela Receita para o ano ficou ainda menor -de R$ 465,78 bilhões.
Segundo documento interno do fisco obtido pela Folha, em julho os auditores foram obrigados a fazer um novo cálculo do recolhimento de tributos para 2009, jogando mais para baixo ainda a previsão: R$ 446,7 bilhões.
Naquele mesmo mês, o Tesouro solicitou à Receita uma arrecadação com R$ 19 bilhões a mais do que a estimativa então feita pelo órgão. Sem esse dinheiro, pela análise do Tesouro, as contas do governo não fechariam.
Do contrário, a saída seria ou promover um bloqueio de despesas autorizados no Orçamento ou reduzir ainda mais o superavit primário (economia de receitas para pagamento da dívida pública).
A queda na arrecadação com o Imposto de Renda foi uma das mais acentuadas. E, dentro desse item, o IR retido na fonte foi um dos mais afetados.
Enquanto a Receita calculou obter ao longo do ano R$ 82,9 bilhões com o IR na fonte, o Tesouro solicitou ao fisco R$ 87,5 bilhões nessa rubrica -uma diferença de R$ 4,6 bilhões.
Diante de todos esses números, a Fazenda viu a necessidade de retardar ainda mais a liberação das devoluções do IR.
Segundo a Folha apurou, a Receita incumbiu o subsecretário de Arrecadação, Michiaki Hashimura, de fazer a reformulação do cronograma das restituições. Foi quando se chegou ao valor aproximado de R$ 12 bilhões para este ano, deixando R$ 3 bilhões para serem devolvidos só em R$ 2010.
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