Igreja dá resposta ambígua à fala de cardeal sobre gays
Folha de S. Paulo
Vaticano desqualifica declaração de número dois do Vaticano relacionando pedofilia e homossexualidade, mas não a nega
Porta-voz do papa Bento 16 afirma que 60% dos abusos contra crianças no ambiente eclesiástico são cometidos por padres homossexuais
O Vaticano respondeu ontem de forma dúbia à revolta mundial deflagrada na segunda-feira pelo cardeal Tarcisio Bertone, que relacionou a pedofilia à homossexualidade. A Santa Sé disse que o eclesiástico não deveria ter feito a controversa declaração mas insistiu em que padres gays são responsáveis pela maioria dos abusos cometidos contra menores na igreja.
Após protestos de associações gays e governos de vários países, o porta-voz do Vaticano, Federico Lombardi, divulgou ontem um comunicado em que cita um estudo que "resulta simplesmente no dado estatístico" de que 60% dos 3.000 casos registrados pela Congregação da Fé desde 2001 envolvem "pessoas do mesmo sexo".
O Vaticano, que tenta há semanas se defender das acusações de acobertar casos de pedofilia, preferiu desqualificar o cardeal Bertone como autor das declarações em vez de desmenti-las. "As autoridades eclesiásticas não se consideram competentes para fazer afirmações gerais de caráter psicológico ou médico, as quais cabem naturalmente ao estudo de especialistas e às pesquisas em curso", diz a nota do porta-voz.
Lombardi também buscou minimizar o alcance das controversas declarações de Bertone e disse que "o cardeal evidentemente se referia à problemática dos abusos sexuais da parte dos sacerdotes, e não da população em geral".
Na prática, a Santa Sé esquivou-se de eliminar por completo o elo entre homossexualidade e pedofilia. O Vaticano também não emitiu uma condenação mais vigorosa contra Bertone, que ocupa o segundo cargo mais importante na hierarquia da Igreja Católica.
As controversas declarações de Bertone foram dadas em conversa com jornalistas durante visita ao Chile. O cardeal afirmou que a pedofilia entre os sacerdotes é fruto da identidade sexual de alguns padres. "Muitos psicólogos e psiquiatras demonstraram que não há relação entre celibato e pedofilia, mas muitos outros demonstraram que há entre homossexualidade e pedofilia", disse. "Essa patologia [pedofilia] aparece em todos os tipos de pessoas e, nos padres, em um grau menor em termos percentuais", disse o religioso italiano.
Desde que um relatório da Igreja Católica na Irlanda, publicado em 2009, revelou que 15 mil crianças foram abusadas por religiosos entre os anos 30 e 90, denúncias vêm se multiplicando na Europa e nos EUA.
Uma linha telefônica para denúncias anônimas por vítimas aberta no fim do mês passado na Alemanha -país natal do papa Bento 16- recebeu quase 15 mil ligações em uma semana. Uma das principais acusações é a omissão dos superiores na hierarquia católica.
quinta-feira, 15 de abril de 2010
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